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blogue editado por José Marques Mendes e Luís Luz

29 de agosto de 2012

Rodrigo Ferrão - A cultura profissional do medo


«Na existência-em-si não há o medo, ou a incerteza, mas é o viver que os cria. E a sociedade, basicamente, não tem qualquer sentido, é apenas um banho romano misto. E a escola, a escola é a sociedade em miniatura: é por isso que nos estão constantemente a dar ordens. Um punhado de homens cegos diz-nos o que temos de fazer, retalha-nos as nossas imensas capacidades.»
in "O Marinheiro que perdeu as graças do Mar", Yukio Mishima.


O medo faz parte do dia-a-dia do Homem. Tanto nas questões íntimas de cada um, como numa sociedade baseada na conjuntura do “medo”. Quando falo em aspectos pessoais, posso referir o medo da morte, uma doença dolorosa, perder alguém, o medo da solidão. Centrando-me na convivência social enquanto conceito mais abrangente, aponto todas as pressões e convenções que nos moldam a um conjunto de usos ou regras. 

Actualmente vive-se a cultura do “medo”. Medo de não ter dinheiro suficiente para cobrir a prestação do banco. Medo de perder o emprego a qualquer momento. Medo da crise Europeia. Medo de perder aquilo que conquistamos. Medo de dar opinião. Medo de sermos julgados. 

E de que forma está esse medo cada vez mais enraizado no mundo profissional?

Nas empresas crescem os cortes. Luta-se contra a despesa e esta inclui a redução do capital humano. Cortar no pessoal implica pedir esforços extra aos que ficam, concentrando mais tarefas e responsabilidades. Como a grande fatia das dispensas é a dos trabalhadores que ganham menos (geralmente os que têm menos tempo de casa e ainda não são efectivos), todos têm medo do “medo” de perder o quase nada que têm.

O medo modela o comportamento dos que ficam e dos que entram. Mas, para os que ficam, a situação é ainda mais precária e frustrante. Ou aceitam uma crescente exigência ou a alternativa é sair e cair no vazio. Ora, este problema gera um constante receio, ansiedade e apreensão.

De certo modo, a “crise” tudo desculpa. E a maioria acata este compromisso com a precariedade sem grandes reclamações. O medo é, assim, prejudicial às empresas. Como os trabalhadores têm receio de perder o emprego, acabam por não ser eles próprios e têm dificuldade em exprimir as suas frustrações e opiniões. Sinal de total impotência.

A generalidade das empresas não aposta na comunicação entre as hierarquias. Vivem de tal forma focadas nos números e resultados que esquecem as pessoas. É fácil dispensar o elo mais fraco. E este está claramente identificado: os pobres e os que estão em fim de contrato.

Este é um pau de dois bicos. Ao diminuir as equipas, diminui-se a qualidade do serviço prestado. Os “sobreviventes” não conseguem responder a tudo, não exercem plenamente as suas funções e não têm capacidade para ajudar na integração de novos elementos. As equipas vivem pautadas pela incerteza, pela insegurança, pelo medo. E não conseguem estabilizar, pensar o presente, encontrar um rumo e criar metodologias. Não se vive o agora, mas a incerteza do que aí possa vir.

Os números não são tudo. São as pessoas que podem mudar as coisas. E isso só será possível havendo transparência e proximidade entre as hierarquias. O medo combate-se pela comunicação. Só assim se motivam (mesmo em conjunturas adversas) os que vivem com tão pouco.

Muitas vezes as melhores soluções não estão na cabeça dos gestores… Estão nos que não têm voz. Porque não convidá-los a pensar em conjunto com os quadros superiores?
Rodrigo Ferrão

8 de agosto de 2012

Burrice Emocional


Isto doi!

Porquê que afastamos as pessoas de quem gostamos?
Muitos dirão: mas eu não afasto nem me afasto das pessoas de quem gosto.
Certo. Fisicamente não mas emocionalmente sim.




Temos uma tendência, para muitos já é um hábito e uma rotina, discutir com os familiares. Com a mulher, com o marido, com os filhos, com os irmãos e, claro, com os pais.
Com os pais é o mais comum.
Até entendo. Se no passado, na nossa formação, eles foram duros connosco, as marcas que persistiram no tempo vão libertar seus efeitos, ainda que perversos.
Não somos maus com eles mas somos inconvenientes. Desagradáveis.

Eu não me vou estender em exemplos porque não pretendo que nos foquemos nisso. Estas palavras servem de reflexão sobre o nosso comportamento. Sobre como somos com quem gostamos no nosso quotidiano.

Quem não tem vizinhos em ambiente que é uma perfeita loucura?
Não há dia que não se discuta. São assim ano após ano e, mesmo sendo assim até fazem mais filhos. As zangas persistem e os filhos presenciam tudo.
Estes casais devem gostar uns dos outros porque vivem juntos e são uma família mas, porque raio discutem todos os dias?

Há irmãos que dizem mal uns dos outros.
Por vezes, há mesmo zanga efetiva pelas mais diversas razões. Sobre isso não comento porque os seres humanos fazem roturas uns com os outros. Se mesmo sendo irmãos levaram a coisa a uma rotura, paciência. Pelo menos não fingem.
Mas, se não fazem roturas e se relacionam porque discutem quando se relacionam? Porque se criticam se se gostam?

Todos nós temos ouvido falar de inteligência emocional. Pois bem, na sua ausência falamos de burrice emocional.
Se não se é inteligente…

Nas relações com os nossos próximos somos por vezes emocionalmente burros, se não vejamos:
- Dizer a um familiar que não percebe nada disto ou daquilo é ser-se emocionalmente burro.
- Dizer a um familiar que sempre foi um incompetente nisto ou naquilo é ser-se emocionalmente burro.
- Não responder ao sms ou telefonema de uma pessoa de quem se gosta é ser-se emocionalmente burro.
- Receber uma chamada de alguém que se gosta e dialogar apenas com sim, não, ok, hum hum, está bem, pode ser, beijinhos e adeus é ser-se emocionalmente burro.
- Usar expressões como, “com esse feitio não vais longe”, “és muito burro”, “és parvo como o teu…”, “não tens jeito nenhum para…”, etc., etc.

E quando se vai a casa dos pais?
Vai-se a casa dos pais, de longe a longe e mesmo assim fazem-se críticas. Resmunga-se com a mãe porque está a por mais comida no prato, critica-se porque não come, porque come muito, porque não dorme, porque dorme muito, porque não sai à rua, porque isto e porque aquilo. Todo este comportamento tem a ver com burrice emocional.

Todo o comportamento emocionalmente negativo tem por consequência afastar as pessoas. Se somos assim com os mais chegados, mais queridos e de quem gostamos então uma das seguintes coisas está a ocorrer:
- afinal não gostamos dessas pessoas tanto assim;
- somos emocionalmente incompetentes;
- somos simplesmente parvos;
- somos uma fachada.

Somos uma fachada porque para os outros mostramos sorrisos, piadas, atenção diálogo sereno, sugestões construtivas e até bom senso.
Do outro lado da fachada somos a crítica fácil, a resmunguice e até a má educação. Ferimos e fugimos. Ferimos mas não cuidamos da ferida.
Isso dói.


Então?
Eu creio que é simples tentar ser melhor e é uma questão de força de vontade. Para ajudar deixo uma equação (emocional) extremamente simples:

G+C+A+M = Inteligência Emocional
G-Gostar > Ter claro de quem se gosta efetivamente
C-Consciência > Ter consciência em cada momento do comportamento que está a ter e parar
A-Assertividade > Não ser agressivo
M-Manutenção > Fazer a manutenção da relação com comunicação periódica

Este é o meu humilde contributo para uma reflexão quotidiana.
Agora e como em tudo na vida, há que praticar.
Obrigado.
José Marques Mendes

1 de agosto de 2012

Cristina Guimarães - Líderes pelo exemplo tornam-se referências

Partiu um grande homem, José Hermano Saraiva. Será um lugar-comum mas também pertinente constatação dizer que o país ficou mais pobre, logo numa altura em que criar riqueza seria a palavra de ordem.
Homem de enorme coerência, nunca pautou o seu discurso pelas circunstâncias. Fiel a princípios que nenhuma circunstância fez abdicar, colocou-se ao serviço de todos, acreditando na construção de um Portugal melhor, mais instruído, mais civilizado, mais respeitador dos percursos que outros fizeram para que hoje a “pátria” tenha memória.
É em sua memória, que o tempo não apagará, que vos peço uma reflexão.O que nos deixa este homem que, conscientemente até ao fim, aceitou os desafios constantes da produção intelectual e permaneceu igual a si próprio, desde sempre, na partilha do conhecimento? O que pensava este homem sobre as traves mestras de nossa sociedade, como o ensino, a justiça e a relação com o passado? De que forma e com que dignidade representou sempre Portugal perante terceiros?
Em algumas entrevistas (http://expresso.sapo.pt/morreu-jose-hermano-saraiva=f741053) teremos ainda a possibilidade de o relembrar. Convido-os a percorrerem um pouco da história deste homem porque urge refletir nestas referências, nestes exemplos, nestes líderes, porque urge fazer mais e melhor. Convido-os a sorver os seus discursos, a sua vasta obra literária, os seus deliciosos programas de televisão. Convido-os a lembrarem e aprenderem. E que a sede de saber não se dilua com o tempo de que, de resto, é exemplo este homem que nos deixa aos 92 anos consciente da meta alcançada após tão desafiante e ganha corrida.
Constato com pena que é a vez de a minha geração começar a ver os seus mais queridos partirem. É, pois, a vez de a minha geração, a dos quarenta, tomar as rédeas das referências que quer deixar aos seus filhos e netos. Estaremos alguma vez à altura de José Hermano Saraiva? Tentemos, pelo menos! Mostremos, pelo menos, que somos bons alunos!

Cristina Machado Guimarães